#CearádeAtitudeEspecial – Delatada pelo pai, Beliza Guedes sobreviveu às perseguições e aos sequestros
25 de agosto de 2016 - 22:33 #anistia #Beliza Guedes #CearádeAtitudeEspecial #Delatada #Memória #pai #perseguições #sequestros #sobreviveu #verdade
Nesta quinta-feira (25), contaremos a história de Beliza Guedes, terceira personagem da série Ceará de Atitude de agosto, mês da anistia. Delatada pelo próprio pai, foi vítima de vários sequestros e presa em Fortaleza e em Brasília. Às 22h de hoje, a TVC vai exibir mais um mini-documentário do especial “Memória e Verdade”. A produção é uma parceria da Coordenadoria de Imprensa da Casa Civil e da Coordenadoria de Direitos Humanos, do Governo do Ceará, com a TVC
“Fui delatada pelo meu próprio pai. Ele era informante do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e do Exército”. A fortalezense Beliza Guedes, hoje com 65 anos, descobriu, após ser anistiada e através de documentos da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que as informações repassadas pelo pai coincidiam com as prisões dela e da irmã Lílian.
Sequestrada pela primeira vez em 1969, a militante do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), foi levada para a 10a Região Militar, no centro da capital cearense. “Me colocaram em um carro, abaixada, e eles com os pés em cima de mim. Fui brutalmente interrogada. O major que me interrogou queria informações sobre o pessoal daqui e de Recife. Descobri, então, que minha irmã Lílian havia sido presa porque ele falava do aparelho de Maria Farinha, em Pernambuco”. O interrogatório, que durou cerca de oito horas, não fugiu ao padrão da ditadura militar brasileira. “Fui obrigada a ficar o tempo todo de pé. O major estava gripado e me cuspia. Ele também me batia na cara e me ameaçava”. Beliza Guedes foi liberada de madrugada. “Eles me soltaram no meio da noite. Voltei para casa toda suja e não podia contar nada porque minha mãe já estava muito abalada com o sumiço da minha irmã. Ela havia sido pega em ação e estava na clandestinidade”, relembra.
Com o primeiro sequestro e o indício de que Lílian havia sido presa, Beliza decide sair do Ceará. “Fugi para o Rio de Janeiro e passei um mês lá, na casa de um conhecido da Aeronáutica. Eu frequentava os cassinos das Forças Armadas e a polícia do Ceará me procurando aqui”, relata. Ao voltar para Fortaleza, as perseguições continuaram. “Segui na militância porque a gente tinha a ilusão de que ia acabar com a ditadura e com a tortura. Mas fui sequestrada várias vezes, recebia telefonemas com ameaças, era perseguida. Eles sabiam de tudo da minha vida. Um dia, me levaram para ver um padre que havia sido assassinado. Eles diziam que eu terminaria daquele jeito”.
“A tortura psicológica, as perseguições
e a delação do meu pai fazem parte
de um baú muito pesado”.
Como a repressão não dava trégua, mudou-se para o Rio e, de lá, para Brasília com a irmã e a mãe. Na capital federal, começou a estudar História e a militar na organização Convergência Socialista. “Essa época foi muito difícil. Descobri que a moça que trabalhava na minha casa era informante da polícia. Fui fotografada num show do Paulinho da Viola e, quando fui presa, foi a primeira foto que me mostraram”. Beliza Guedes foi presa em 1978 por ter livros considerados subversivos em casa. Ficou quase dois meses presa na Polícia Federal de Brasília. “Nessa época eu já era hipertensa e, na prisão, minha pressão subiu muito e fui hospitalizada. Perdi 12 quilos em um mês. Fiquei muito mal, mas, um dia, chutei a grade da cama com força e bateu na perna do policial. Apanhei muito nesse dia”, conta.
Beliza Guedes carrega as marcas desse período até hoje. Ela sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) aos 23 anos e um infarto, aos 40. “A tortura psicológica, as perseguições e a delação do meu pai fazem parte de um baú muito pesado. Tive muitos problemas de saúde. O médico que me trata disse que são problemas de sofrimento. Um dia, contei a minha história e ele chorou”.
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25.08.2016
Wania Caldas
Gestora de Célula / Conteúdo
Fotos: José Wagner / Governo do Ceará